Análise preliminar do Orçamento Federal mostra que 14 dos 20 parlamentares goianos no Congresso Nacional somaram R$ 108,4 milhões em emendas “sem carimbo” para 2022, ano eleitoral. Trata-se das transferências especiais, modalidade apelidada de “pix orçamentário”, e que permite a transferência direta de recursos de emendas impositivas a Estados e municípios. O valor é 40,7% maior do que o destinado neste ano, e 272,5% superior aos recursos empregados na modalidade em 2020.As informações são do Instituto Nacional de Orçamento Público (Inop), antecipadas pela coluna Giro no sábado (11). Oito dos parlamentares goianos alcançaram ou chegaram perto do teto de aproximadamente R$ 8,82 milhões permitidos para a modalidade — cada parlamentar pode destinar, nessa categoria, até 50% dos R$ 17,6 milhões em emendas impositivas a que tem direito; os outros 50% são obrigatoriamente na saúde.Destinaram mais de R$ 8 milhões na modalidade: o senador Luiz do Carmo (MDB), único entre os três goianos no Senado que tenta a reeleição — Vanderlan Cardoso (PSD) e Jorge Kajuru (Cidadania) foram eleitos em 2018 —, e os deputados Magda Mofatto (PL), Waldir Soares (PSL), Célio Silveira (PSDB), Alcides Rodrigues (Patriota), Adriano Avelar (PP), José Nelto (Podemos) e Glaustin da Fokus (PSC).Entre eles, Magda, Luiz do Carmo e Waldir estão entre os 69 parlamentares no País que colocaram R$ 8,819 milhões ou mais, o que o Inop considera como alcance do teto, como explica ao POPULAR o diretor do instituto, Renatho Melo. “Consideramos que alcançaram o teto porque a diferença é muito pequena, uma vez que 50% das emendas devem ser obrigatoriamente destinadas à saúde.” A rigor, os 50% são R$ 8.819.682. Em Goiás, apenas Magda chegou neste montante total.Completam a lista dos 14 goianos com destinações na modalidade os deputados: Flávia Morais (PDT), José Mário Schreiner (DEM), Rubens Otoni (PT), Alcides Ribeiro (PP), Elias Vaz (PSB) e Vitor Hugo (PSL). Destinaram entre R$ 5 milhões e R$ 7,8 milhões, cada (veja quadro).No Brasil, deputados e senadores somaram R$ 3,2 bilhões em transferências especiais para 2022, sendo R$ 2,9 bilhões de 446 dos 513 deputados federais, e R$ 379,8 milhões de 60 dos 81 senadores. No País, o aumento foi de 71,1% em relação a este ano, e 427,9% ante 2020.Essa modalidade de emendas é alvo de uma série de questionamentos por parte dos órgãos de controle por permitir que o dinheiro seja usado para quase qualquer finalidade, sem controle prévio, e só seja fiscalizado depois de executado pelos Estados e municípios que os receberam. Além disso, a publicidade dos gastos não é obrigatória.Essa publicidade ao gasto do recurso público pode ser feita pelas prefeituras pela Plataforma Mais Brasil, do governo federal, por meio do preenchimento de relatório de gestão. Contudo, a “prestação de contas” é opcional, visto que a Emenda à Constituição que criou a modalidade de emendas parlamentares em 2019 não normatiza a questão.Tanto que, como o POPULAR mostrou em agosto deste ano, apenas três das 68 cidades de Goiás que receberam recursos das emendas “sem carimbo” em 2020 deram publicidade ao que foi feito com o dinheiro. Naquele ano, em que ocorreram as eleições municipais, as prefeituras receberam R$ 29,1 milhões de emendas parlamentares federais via transferência especial.“Não há nada que obrigue o preenchimento desse relatório, que está longe de ser uma prestação de contas dos recursos de transferências especiais, mas que representa um indicativo de como o dinheiro está sendo gasto”, explicou Renatho Melo à época.FISCALIZAÇÃONeste mês, o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Raimundo Carreiro assinou despacho para que a Corte acompanhe os repasses das transferências especiais, acatando pedido do deputado Vinicius Poit (Novo-SP). Ele solicitou, em agosto, que o tribunal faça tomada de contas especial na aplicação de recursos dessas emendas referente a 2020.No despacho, o ministro também determinou a formação de um painel de especialistas para discutir o tema. Segundo ele, como mostrou o jornal Folha de S. Paulo, o tema é “altamente relevante para a governança orçamentária do país.” O debate ocorre em meio às polêmicas geradas por outra modalidade de emendas parlamentares, a RP9. Trata-se das emendas de relator que compõem o chamado “orçamento secreto”, que não faz parte do rol de emendas impositivas de deputados e senadores.A modalidade recebe este nome justamente porque os parlamentares indicam uso de orçamento dos ministérios, mas não existem critérios claros para essas indicações e nem divulgação de quem as fez, o que abre brechas para acordos políticos sem qualquer transparência.Antes da criação da RP9, em 2019, os parlamentares contavam com uma “emenda extra orçamentária”, mas que dependia de articulação junto aos ministérios. Essas indicações entravam no chamado RP2, que são recursos discricionários dos ministérios usados para custeio, como de saúde e educação, ou investimentos, como obras e compra de equipamentos — o uso e destino do dinheiro depende da atribuição de cada pasta.Desde a criação do RP9, contudo, esse tipo de “emenda” passou a entrar nessa nova tipificação orçamentária. Apesar de a prática de indicação de recursos por deputados e senadores ser antiga, porém, agora, isso ganhou contornos mais claramente políticos, desde que o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) passou a atuar mais fortemente para fortalecer a sua base no Congresso Nacional.Para o diretor do Inop, Renatho Melo, há semelhanças entre as transferências especiais e o “orçamento secreto”. “Como não é aceitável meia transparência com as emendas de relator, chamadas de ‘orçamento secreto’, não é aceitável também que isso ocorra nas emendas especiais, que sofrem do mesmo problema em fases diferentes no processo de execução.”-Imagem (1.2374475)