Alegando que está em fase de colocar a casa em ordem para daqui a 60 dias sair pela cidade “convocando a população para os mutirões”, o prefeito Iris Rezende (PMDB) define o primeiro mês de mandato a partir de uma comparação com a rotina do trabalhador comum que vai até a garagem, abre a porta do carro e passa no posto de gasolina para só depois chegar ao trabalho. O peemedebista diz que seu quarto mandato à frente do Paço Municipal está no princípio desse ritual diário, mas refuta críticas daqueles que dizem que a gestão atual tem demorado mais a engrenar do que outras. Entre audiências com vereadores, deputados estaduais, outras lideranças políticas e empresários que ainda lotam seu gabinete em busca de respostas para demandas que vão desde disposições de servidores e nomeações de comissionados até a cobrança por dívidas da gestão passada, Iris recebeu o POPULAR em seu gabinete para fazer um balanço de início da gestão. O prefeito também falou da relação administrativa com o governador Marconi Perillo (PSDB) e não descartou a possibilidade de aliança de seu partido com o do tucano em 2018. “Se amanhã eu entender que um projeto político possa ser importante para Goiás, eu não fugirei dele. Nunca permiti que o ódio dominasse os meus sentimentos”, disse o peemedebista.O sr. tem dito que dedicou o primeiro mês para conhecer a situação da Prefeitura. Qual é o diagnóstico?Vi recentemente uma reportagem mostrando a situação do Cais do Bairro Goiá, com banheiros quebrados, tudo destruído. É revoltante e está assim em todas as áreas. A Prefeitura recebeu muitos recursos do governo federal, mas todas as obras licitadas e iniciadas com estes recursos estão paralisadas porque ela não deu sua contrapartida. As empresas paralisaram (serviços) porque não receberam. Consegui começar a tapar buracos porque conversei pessoalmente com fornecedores. Disse que não ia discutir dívida, mas uma coisa podia garantir: daqui para frente eles vão receber pelo que fornecerem. O meu princípio administrativo é o de só comprar à vista. Então tudo custa menos de um terço. Só contrato a obra se sei que vou pagar. Eu centralizo tudo. Tudo! O primeiro decreto que assinei aqui foi para determinar que gastos com materiais permanentes só serão realizados com autorização expressa do prefeito. Não há o risco de engessar a gestão agindo desta forma? Pelo contrário. Fiquei cinco anos aqui (na Prefeitura, entre 2005 e 2010) e nunca fiz uma viagem para o exterior. Só saí um dia para fora do Estado, a não ser Brasília para audiência com ministro. Fui ao sepultamento da dona Ruth (Cardoso, mulher do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em 2008). Não fui a um congresso. Fico aqui de dia e de noite. Secretário não tem horário de despacho. Eles chegam a qualquer hora, assinam e vão embora. Mas só assino sabendo o que tenho em caixa. A Secretaria de Finanças me dá um relatório todo dia pela manhã. Eu vejo o que se gastou, a quem se pagou. Na primeira reunião com secretariado, eu disse que dívida atrasada só será paga com minha autorização. Só vou pagar dívida quando tiver dinheiro em caixa. Surgiram críticas ao início de seu mandato a partir de comparações com outras gestões suas, que teriam começado mais ágeis. O sr. também acha que esta gestão está demorando mais para engrenar?Não. Você veja que não descansei um dia. Dediquei um cuidado muito especial à formação da equipe. Talvez eu tenha demorado na formação da equipe, mas não enquanto a obras. O que eu ia fazer em uma Prefeitura que estava devendo a todo mundo? Ia começar obra de que jeito? Sem planejar, sem nada! Na verdade, a Comissão de Transição não me trouxe um resultado completo. Faltou diálogo com a gestão passada?Não encontraram a oportunidade de conhecer a realidade. Até hoje estamos submetidos a alguns compromissos (da gestão passada) que não foram honrados. Mas não é esse o caso. A verdade é que hoje o débito supera R$ 600 milhões com déficit mensal de R$ 30 milhões. É essa realidade que vim para mudar. E vou mudar. Qual o maior entrave para fechar a equipe? O senhor levou duas semanas para divulgar nomes e ela ainda não está completa (Amma tem presidente interino e CMTC continua sem novo comando). Em outras eleições se tinha até cinco meses e meio de prazo até a posse. Quando fui eleito governador pela primeira vez, venci as eleições em 3 de outubro de 1982 e fui tomar posse em 15 de março de 1983. Agora nós tivemos 60 dias da apuração até a posse. Estamos estruturando as áreas de recursos humanos e financeira. Na campanha o sr. falou muito sobre moralização da política. Agora seu secretariado é composto por alguns nomes que têm sido questionados pelo envolvimento em casos de corrupção. Não é contrassenso? Normalmente, quando as pessoas são denunciadas, a sociedade já olha com desconfiança. Militei alguns anos na advocacia e atuei muito na área criminal. Quantas pessoas eu defendi e minha função não era enganar a Justiça, era mostrar que elas não tinham culpa. Aprendi que não se pode prejulgar ninguém. Se a pessoa não é presa em flagrante, se não existe prova contundente, você já não pode prejulgar e condenar. Se nomeei pessoas denunciadas é porque as conheço, sei da honorabilidade de cada uma e não existe sentença condenatória. Cabe ao administrador bom senso para privilegiar pessoas competentes, colocando denúncias e ilações em um patamar bem distante para que as pessoas não sejam injustiçadas. O Samuel Almeida (secretário de Governo) foi condenado. Ele foi deputado estadual. Não conheço que ele estivesse aí para cumprir penalidade imposta pela Justiça. E não conheço a de nenhum. Todos tiverem de apresentar as certidões negativas de débito com a Justiça. Não posso dar posse sem a apresentação destas certidões. E também não posso ficar me guiando por informações e denúncias. Quando o sr. acha que vai mostrar resultados para além de ações de limpeza e conservação, que foram o foco até agora?Por que não estou aí convocando o povo para os mutirões nos bairros? A estrutura da Prefeitura está toda desmontada. Veículos e máquinas estão imprestáveis, dependem de recuperação. As empresas que alugam veículos e máquinas suspenderam os serviços porque têm milhões para receber. Mas isso não me espanta. Todas as vezes que tomei posse encontrei situações assim. Estou nessa fase de montagem de uma estrutura humana e material para daqui a 60 dias, tão logo passe essa estação chuvosa, nós já estejamos juntos com a sociedade realizando mutirões em todas as áreas. Em relação aos projetos. O que é prioritário hoje?A primeira preocupação é com a área da saúde. Não é possível que em uma cidade com nível de vida como o de Goiânia a gente veja as pessoas morrendo por falta de atendimento na porta das unidades de saúde. Vamos convocar os poderes federal e estadual para enfrentar isto. Temos mais de 4 milhões de pessoas inscritas como moradores de Goiânia, que tem menos de 2 milhões de habitantes. Vamos fazer o recadastramento sem muita demora. Hoje, mesmo se o paciente está no interior e não tem condições de atendimento, tudo é debitado em Goiânia, que tem levado um prejuízo muito grande. Vamos remunerar bem os trabalhadores da saúde e recuperar equipamentos. Mesmo com a participação do Estado e da União, este tipo de medida demanda dinheiro da Prefeitura. O sr. vai realizar mais cortes de gastos? Vamos atuar em todas áreas que forem necessárias. Estamos todos esses dias nos aprofundando para conhecer a realidade da situação da Prefeitura. No mesmo instante que nos deparamos com a realidade das escolas, dos Cais, também nos deparamos com gastos. Vamos reduzindo gastos dispensáveis e nos reservando para aqueles que são indispensáveis. Isso, não tenha dúvida, eu sei fazer e tenho mostrado ao longo da minha vida. O sr. já decidiu se fará reforma administrativa? Talvez alguns reparos. Goiânia é uma cidade que cresce muito. O que hoje você pode considerar exagerado amanhã estará reduzido. Na administração anterior, consegui asfaltar todos os bairros de Goiânia. Hoje, já são 25, 26 bairros esperando asfalto. Temos de pensar na pavimentação, na habitação. Na campanha, as regionais administrativas tiveram um grande destaque. O sr. já começou a tratar desse projeto? Ele vai sair do papel?A administração não aceita mágica, sonho. Ela exige iniciativas viáveis. Na administração anterior, chegamos a encaminhar um projeto de lei criando as regionais administrativas, mas depois, inesperadamente, atendi aquele convite e deixei a Prefeitura para ser candidato a governador. Mas vamos realizar, colocar em funcionamento este projeto. Hoje, uma pequena estrutura de comunicação resolve o problema, mas também precisamos de local próximo para guardar e dar manutenção em máquinas e equipamentos. Há duas semanas o sr. se encontrou com o governador Marconi Perillo (PSDB) em tom amistoso que muitos dizem ser inédito. Qual o limite entre a boa relação administrativa e a política? Quando o ex-prefeito Paulo Garcia (PT) começou a se aproximar do governador, houve muitas críticas do PMDB, inclusive do sr.O detentor de mandato popular não pode em hipótese nenhuma misturar paixões político-partidárias ou desavenças pessoais com o interesse público. Fui eleito governador em 1982 contra o regime militar e nunca tive condescendência com ele. Mas tive um relacionamento que não trouxe prejuízo administrativo para Goiás. Já fui prefeito com o governador Marconi e havia até perdido eleição para ele, mas todas as vezes que sentia que a Prefeitura estava prejudicada, o procurei, fiz minhas ponderações e ele acatou. Nunca tivemos dificuldades nesse relacionamento. Mas isso pode avançar para uma conversa política? Houve a tentativa de aliança com o sr. no ano passado e até nesse encontro o governador fez uma brincadeira neste sentido. PMDB e PSDB podem estar juntos em 2018? Não quero discutir questões político-partidárias, sucessões, enquanto eu não colocar a Prefeitura de Goiânia em ordem. Tem um princípio bíblico que diz que tudo tem seu tempo. Hoje, estamos no tempo de iniciar a administração que possa corresponder às expectativas do povo. Na época da eleição vou me posicionar. Não sou homem de ficar com uma perna em cada canoa. Se amanhã eu entender que um projeto político possa ser importante para Goiás eu não fugirei dele. Nunca permiti que o ódio dominasse os meus sentimentos. Não sei odiar. Sou pessoa que pratica a política com espírito público. Na campanha o sr. foi muito enfático em relação ao interesse em municipalizar os serviços de água e esgoto. Agora a impressão é a de que este discurso está mais brando. O que mudou?Não é isso. Entrei neste processo quando tomei conhecimento de que o Estado estava terceirizando os serviços de água e esgoto de Goiânia, já tinha uma negociação adiantada. Nesse mesmo momento, a Prefeitura encaminhava para Câmara um projeto dando mais 30 anos de concessão para a Saneago. Nessa hora, como candidato, me senti no dever de participar desse debate e assumi aquela posição, assim como quando soube da proposta de modificação da região metropolitana. Posso lhe dizer que o governador se sensibilizou e esses processos estão como que suspensos até uma discussão. Não sai vencido ou vencedor. É uma preocupação com o espírito público e entendo que este é o mesmo sentimento do governo. Então a saída para esta questão da Saneago será amigável?Estou sentindo que o espírito hoje entre o governo estadual e o governo municipal é de encontro de caminho que leve o melhor para a população. O sr. já disse que tem debatido o transporte coletivo com o Ministério Público e há uma proposta para diferenciar a cobrança da passagem de acordo com a distância percorrida. Sua posição é favorável a essa mudança?Sou prefeito de Goiânia e tenho o dever de zelar pelos interesses da população de Goiânia. Se o Estado tem interesse em alongar o percurso da linha de ônibus para atender outro município, sou favorável que ele arque com esse acréscimo. Grande parte dos usuários do transporte coletivo de Aparecida de Goiânia, Trindade e Goianira prestam serviços em Goiânia. Devemos ter consideração com essas pessoas. Tudo isso deve ser levado em conta, mas dentro da racionalidade. O sr. disse em ocasiões anteriores que poderia até mesmo pensar em uma nova licitação para o transporte coletivo. Pelo que viu até agora, essa possibilidade existe ou foi descartada?Vamos criar grupos de trabalho neste sentido. O que for necessário eu vou fazer. Se for necessário abrir linhas ou entender que uma linha é importante e as atuais empresas não quiserem fazê-lo, vou abrir licitação. Não tenha dúvida disso. Na administração passada, abrimos a Avenida Noroeste foi pensando em linha de ônibus, para evitar que o trabalhador fique dando volta. Tenho esse mérito. Sempre governei olhando para o futuro. Não vai demorar muito as coisas vão começar a se realizar. E o aumento das passagens? Há clima para isto?Tudo dentro da racionalidade. Quando assumi a Prefeitura da outra vez, colocamos 1.200 ônibus zero quilômetro. Colocamos no edital que o preço da passagem que o reajuste seria anual levando em conta preço de combustível, salário, pneus. Goiânia se satisfez com quantidade de ônibus e ninguém reclamou quando foi feito o primeiro reajuste. No segundo ano, ninguém reclamou. No dia que entenderam de dar passagens grátis e não reajustar na data, acabou. Está aí a situação que você está vendo. O administrador precisa ter coragem para tomar as atitudes, sejam elas simpáticas ou não, desde que sejam justas e necessárias. Uma das piores crises está na Secretaria Municipal de Trânsito (SMT). Há quem defenda a transformação em Agência para que o dinheiro das multas viabilize a sua recuperação. O sr. estuda esta saída?Quando era prefeito funcionava bem. Tudo está nesta situação. Não queria ser arrogante, mas é falta de gerência. Você vai notar que o comportamento da SMT vai mudar. A população será devidamente atendida. Como exigir um bom trabalho se nem estrutura para isto o poder público dá? Estamos pensando e estruturando tudo. A participação de Iris de Araújo (PMDB) na sua administração tem gerado polêmica e queixa por parte de aliados. O sr. acha que atuação dela extrapola os limites da atuação de uma primeira-dama?Me causaria espanto se a minha mulher ficasse ausente, distante da administração. Preocupar da administração junto comigo é dever da minha família, amigos e companheiros. Se ela estivesse nomeada, recebendo salário, poderiam falar que ela está se aproveitando do poder que o povo deu para beneficiar a família. Mas não, está espontaneamente vivendo as questões da administração, ajudando a receber as pessoas. Sempre foi assim. Ela nunca ficou distante. E ela tem projeto político para 2018?Isso eu não sei.