Atualizada às 23:50 desta segunda-feira (29)Diante de previsão de colapso no sistema de saúde em Goiás em duas semanas, feita pela Universidade Federal de Goiás (UFG), o governador Ronaldo Caiado (DEM) reeditou o decreto de março, com fechamento de atividades não essenciais no Estado, por 14 dias, a partir de hoje. A intenção é criar o isolamento intermitente, alternando abertura e fechamento pelo mesmo período, em atendimento à recomendação do grupo técnico da UFG que monitora evolução do coronavírus em Goiás.O decreto vale para todo o Estado, mas a adesão caberá a cada prefeito, sob argumento de que o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu que é responsabilidade dos municípios e dos Estados definir as regras de enfrentamento ao coronavírus. No entendimento do governo, para não seguir o decreto estadual, cada prefeito terá de editar normas específicas para o município, que terão de ser justificadas com notas técnicas da área de saúde.O decreto de março determinou o fechamento do comércio, feiras, shoppings, igrejas, consultórios odontológicos e eventos esportivos. Na edição atual, divulgada ontem às 22h22, após 14 dias, restaurantes poderão reabrir, mas, além de protocolos específicos, deverão observar a lotação máxima de 50% de suas capacidades de acomodação.(Veja quadro nas páginas 6 e 7)O governador afirmou que o objetivo é alcançar 55% de isolamento social. O Estado registra hoje 35,3% em média em dias úteis. Questionado sobre as pequenas chances de haver adesão por parte da maioria dos prefeitos, Caiado disse que “nunca é tarde para insistir” e que é momento de analisar quem está apresentando “argumentos populistas ou egoístas”.A Prefeitura de Goiânia, que intensificou as flexibilizações nas últimas semanas e previa permitir a reabertura das lojas da região da 44 nesta terça-feira, informou que seguirá as regras defendidas por Caiado (leia mais na página 7).“Já pensou o quanto esses dados (de contaminados e mortos e das projeções) devem estar provocando dor de consciência enorme em alguns? Eu sou insistente. Vou convocá-los novamente”, afirmou, em referência a prefeitos e empresários favoráveis às flexibilizações mais intensas.Em videoconferência com os representantes dos municípios, do setor empresarial e de poderes e órgãos autônomos do Estado, na manhã de ontem, o governador pediu que os técnicos da UFG apresentassem resultados preliminares da quarta nota técnica que será lançada pelo grupo. No documento, a universidade indicará que, se o Estado mantiver o mesmo índice de isolamento atual (menos de 35%), poderá chegar a 18 mil mortes no final de setembro.O professor e pesquisador Thiago Rangel, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFG, disse que, com a proposta de fechamento alternado de 14 dias mais a implantação de estratégia de rastreamento de portadores da doença, é possível reduzir em 10,28 mil o número de mortos até o fim de setembro. “Deixar como está é inaceitável e imoral. Não é uma opção”, afirmou.Para o rastreamento, é necessário elevar a testagem e garantir de forma mais rápida o isolamento por dez dias de pessoas infectadas e daqueles com os quais convivem. Para viabilizar o rastreamento, serão necessários, segundo Thiago Rangel, dois mil monitores. Caiado defendeu que empregadores e prefeitos adquiram testes PCR para realizar exames semanalmente. Mais tarde, disse que os técnicos da Saúde vão recomendar a periodicidade mais adequada. Pediu também que prefeitos utilizem verbas federais para ampliar a testagem.Thiago afirmou que, se houvesse um lockdown (fechamento total, inclusive com restrições para que as pessoas circulem nas ruas) por três meses, o número de mortos cairia para 4 mil, segundo as projeções do grupo. No entanto, ele entende que não haveria adesão da população e forte impacto socioeconômico. Assim, o isolamento intermitente seria um meio termo entre fechamento total e a flexibilização excessiva da maioria das cidades goianas.Caiado afirmou que colocará à disposição dos prefeitos o efetivo das forças policiais para assegurar o cumprimento da quarentena intermitente. Defendeu um “sistema de mutirão”, com participação de todos os Poderes, gestores e empresários para evitar mortes.Ao participar da videoconferência, o secretário estadual da Saúde, Ismael Alexandrino, disse que não há a menor possibilidade de o Estado alcançar 2 mil leitos de UTI porque faltam equipamentos, medicamentos e pessoal para atuar nas unidades. Esta é a demanda que a UFG aponta como necessária até o final de julho se o isolamento se mantiver baixo. Em 15 dias, será necessário o dobro do número de leitos demandado atualmente, daí a UFG falar em possibilidade de colapso do sistema de saúde. A previsão do secretário é chegar a 600 leitos, afirmando ser o dobro do que tinha antes do início das medidas de enfrentamento à pandemia.Ismael também informou o cancelamento de cirurgias eletivas, nos sistemas público e privado, para economizar medicamentos necessários às internações por Covid-19.Ao final da videoconferências, representantes de Poderes e órgãos autônomos disseram ser importante a iniciativa da quarentena intermitente.CalibragemO grupo de estudo da UFG alterou a projeção de casos e mortes por coronavírus para o final de julho em Goiás, reduzindo em mais de 2,2 mil a previsão de óbitos para o próximo mês. Em nota técnica emitida no final de maio, os técnicos afirmavam que, se mantido o baixo isolamento social, o Estado teria pelo menos 5.360 mortes até 31 de julho. Agora a projeção é de 3.101, mas chegando a 18.000 no fim de setembro.Thiago Rangel afirmou que houve “calibragem” por conta do segundo inquérito populacional realizado em Goiânia, que mostrou que apenas 2% da população teve contato com o vírus. Na nota técnica anterior, só havia o primeiro inquérito, com prevalência de 0,7%. “Na nota técnica 3, o modelo estava rápido demais em número de infectados, portanto a letalidade estava baixa. O segundo inquérito mostrou baixo contato e número de mortos maior. A curva de óbitos continua igual, mas com menos pessoas infectadas. Ou seja, a letalidade da doença sobe, mas em prazo maior”, diz o professor.Ele também afirma que, pelo número de infectados ser menor do que a suposição anterior, há mais pessoas suscetíveis do que se considerava na nota técnica 3. “O pico é muito mais alto porque tem mais gente para ser infectada ao longo do tempo”, diz.BolsonaroApesar do tom forte de críticas a prefeitos e empresários que defendem flexibilização, o governador minimizou o comportamento do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que novamente esteve em Goiás (em distrito de Ipameri) no fim de semana e conversou de perto com moradores, sem máscara. “É um detalhe. Tem muito deputado, muito prefeito, muito presidente de entidade que se comporta assim. Não é apenas uma figura. Eu tenho de tomar atitudes que sejam consequentes para salvar vidas. Não essa coisa de tititi”, disse.