Um ano e oito meses após a Câmara aprovar projeto de lei que autorizou a criação de uma loteria municipal em Goiânia, o vereador Pedro Azulão Jr. (MDB) propôs revogar a norma. O projeto original foi apresentado por Léo José (SD) e foi aprovado em setembro de 2023. Na época, a tramitação da matéria teve apoio do ex-prefeito Rogério Cruz (SD), que viu oportunidade de incrementar a receita do município, para arcar com despesas de previdência, transporte público e áreas sociais.Em 2023, Azulão era membro da base de Cruz e foi favorável ao projeto. Agora, no contexto de debate sobre impacto das apostas on-line na saúde mental e economia doméstica da população, Azulão afirma que está arrependido do posicionamento anterior e que pretende “lutar para corrigir esse erro horrível que a Câmara cometeu”.De acordo com Azulão, na época, o então secretário de Governo, Jovair Arantes, pediu que ele votasse a favor da matéria, afirmando que era importante para a Prefeitura. “Quando escolhe ser da base, tem os remédios amargos que tem que tomar”, disse. Azulão também é base do prefeito Sandro Mabel (UB).O emedebista protocolou o novo projeto em 28 de maio e disse que começou a articular com colegas pela aprovação. A matéria chegou à Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ) na sexta-feira (30) e foi encaminhada para análise de rotina da Procuradoria da Casa.Já Léo José afirmou que o objetivo de Azulão é gerar “barulho” e que o emedebista não conseguirá votos suficientes para aprovar a proposta. Léo José também argumentou que a lei é autorizativa, gera receita para a Prefeitura e, por isso, não poderia ser revogada por projeto de lei apresentado por um vereador. No entanto, Azulão disse que sua proposta tem segurança jurídica. Funcionários da Câmara que atuam nesta área também afirmaram que Azulão usou o instrumento correto para revogar uma lei.Líder do prefeito, Igor Franco (MDB) disse que o Paço ainda não tem posicionamento oficial sobre o assunto. Franco afirmou que nunca tratou sobre o tema com Mabel. Para o líder, existe clima favorável na Câmara, mas, no momento da votação, a base seguirá a orientação do Paço. Em nota, a Prefeitura disse que a Procuradoria-Geral do Município (PGM) ainda não tem conhecimento do projeto e só vai se manifestar após analisar a matéria.Com a autorização para ter uma loteria municipal, a Prefeitura pode explorar, por exemplo, o prognóstico esportivo de quota fixa, um dos tipos mais conhecidos de “bet esportiva”. Também são previstas outras modalidades, como em que o apostador compra bilhete já numerado (físico ou virtual); a tentativa de prever quais serão os números sorteados em um concurso; e a categoria de resultado instantâneo, em que se apresenta, de imediato, se o apostador foi ou não contemplado com alguma premiação.Em novembro de 2024, O POPULAR perguntou a Mabel (era prefeito eleito) sobre o interesse em dar continuidade à loteria municipal durante seu mandato. Na época, o prefeito afirmou que ainda não conhecia os termos da lei aprovada em Goiânia, mas adiantou que é “contra jogos”, especialmente as “bets”.TramitaçãoEm 2023, o projeto de Léo José foi aprovado mesmo com parecer contrário da Procuradoria da Câmara, que apontou inconstitucionalidade por falta de competência dos vereadores sobre o tema. Ou seja, a atribuição para propor um serviço de loteria municipal seria da Prefeitura. O Paço chegou a vetar parcialmente a matéria, mas o posicionamento de Cruz foi derrubado pela Câmara. Em dezembro de 2023, a Prefeitura publicou decreto que regulamentou a lei.Em outubro de 2024, a administração, por meio da então Secretaria Municipal de Finanças (foi transformada em Secretaria da Fazenda, a partir de 2025) publicou uma portaria para formar comissão temporária para conduzir os procedimentos para a licitação da loteria. Cruz chegou a marcar a data do processo para 9 de dezembro de 2024. No entanto, o processo foi suspenso por decisão liminar do Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás (TCM-GO), que, segundo o órgão de controle, está vigente. O objetivo da licitação era contratar a empresa que faria a gestão e controle da loteria municipal por 10 anos. A estimativa de arrecadação para o primeiro ano era de R$ 43 milhões.Na decisão do TCM-GO, assinada pelo conselheiro Fabrício Motta, foram reconhecidos indícios de suposta irregularidade, apresentados por empresa interessada no certame, que apontou problemas na divulgação, objeto e exigências de habilitação técnica e financeira do edital. Motta também considerou a tentativa de contratação nos últimos meses da gestão.